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The Pólis

Há uma área na qual, em Portugal, existem apenas dois tipos de especialistas. Há os que estudaram nessa área e há o resto do país. Falo de comunicação. Deve ser rara a pessoa que, se se deparar com um tema relativo a comunicação, não se sinta mais que autorizada a dar o seu parecer vinculativo. 

Não é que apenas os "entendidos" possam opinar sobre o assunto, é o não reconhecimento de que talvez esses saibam, digamos, um pouco mais sobre.Por cá, se sabe falar, se sabe ler, se até consegue dizer que acha giro ou feio, então consegue facilmente decifrar e delinear estratégias e escolhas de comunicação. Esse dom que muita gente recebe à nascença, gera muita desvalorização da relevância que tem esta área. 

Aos que consideram que não é necessário ter nenhum conhecimento específico em comunicação, para a trabalhar e atingir os objetivos que se pretende, isto é, para a produzir com eficácia, aconselho que tomem atenção à guerra da Ucrânia para lá do óbvio. 

Este conflito armado despontou com mais violência em fevereiro, e à partida todos olhámos para ele e pensámos que seria tão equilibrado quanto colocar um crocodilo num galinheiro. Tal como referi, iniciou-se em fevereiro. Faltam cerca de 2 meses para completar um ano. 
Continua hoje a verificar-se que a Ucrânia resiste e insiste em não desistir da sua soberania.

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Vários fatores contribuem para que consigam continuar a resistir: o apoio que vão tendo, a sua coragem, talvez o excesso de confiança que os russos tiveram. Há um que talvez passe mais despercebido apesar de ser o que mais está à vista de todos. É precisamente a estratégia de comunicação. 

O contínuo esforço para se manterem nas "trends" , na comunicação social e nas redes, é assinalável. Os discursos do presidente ucraniano, carregados de soundbytes e  cuidadosamente adaptados para pressionar os gatilhos emocionais de cada audiência. 
A narrativa do underdog que se alimenta de patriotismo, esperança e coragem para fazer frente a um Golias. Tudo preparado e executado em grande velocidade porque a guerra não espera e a atenção da comunidade global muito menos. 

Esta tem sido a grande arma da Ucrânia, manter-nos atentos, preocupados e a torcer por eles, até mesmo na Rússia.  É graças a isso que o assunto não foi engavetado, como acontece com tantos outros conflitos armados. Gracas a esta aposta na presença mediática, a Ucrânia criou um motivo para os líderes mundiais não a esquecerem: apoiá-la dá boa imprensa, dá boa imagem, dá aprovação positiva da maioria dos eleitores. 
Quem apoiar mais a Ucrânia, quem receber aquele elogio de Zelensky, consegue umas boas golfadas de ar e ficar associado a valores quase unanimemente apreciados mundo fora. 

Em troca, a Ucrânia recebe apoio militar, aceleração de processos que de outra forma demorariam anos ( adesão à União Europeia, entrada na NATO...) e espinham os avanços desejados por Vladimir Putin. 

Este último utiliza uma abordagem de comunicativa diferente. Para além da disseminação de informação falsa, um clássico de guerras o qual existe sempre em ambos os lados de um conflito, a aposta passa pela modelação subtil da narrativa. 
A ideia não é minar o apoio à Ucrânia conquistando afeição à sua vontade de capturar o o que não lhe pertence, ou seja, não vamos ver Putin a fazer nenhum discurso emotivo para que o compreendamos. Com alguma atenção o que podemos verificar é que a ideia passa por equivalermos o Kremlin à NATO, à Casa Branca e à União Europeia. Sendo todos igualmente culpados, ninguém é culpado, nem mesmo um país que invadiu outro chamando-lhe "operação especial". 
Até que ponto, nas democracias liberais do ocidente, vão os eleitores apoiar um apoio do seu país a um conflito estrangeiro se considerarem que o invasor é tão desprezível quanto o invadido e os seus aliados?  

Dois países que obviamente estão muito atentos e um deles até mais que isso, ao desenrolar de todos estes processos, são a China e Taiwan. Todos os dias que a Ucrânia aguentar são suspiros de alívio em Taipé. A guerra por lá também se iniciou há algum tempo, sob forma cibernética e, claro, muito também no plano da comunicação. 
A ilha considerada capital da democracia digital, é um dos países mais bombardeados com informação falsa, oriunda da sua grande vizinha China. A ideia, mais uma vez, passa por corroer por dentro o que ainda não conseguem por fora. 
Uma das defesas mais caricatas que Taiwan levantou face a este problema foi a utilização de um software que deteta informação falsa e rapidamente ativa um processo de desenvolvimento de um "meme" que a ridiculariza ("Humor over Rumor"). Audrey Tang, ministra dos assuntos digitais, justificava a velocidade de resposta à informação falsa dizendo que basta um dia de atraso na reacção para que  a informação tóxica já tenha penetrado na memória de longa duração das pessoas. 
Em Taiwan não se desvaloriza o poder da comunicação.

São alguns breves exemplos que demonstram que descurar algo com tanto impacto na nossa vida, na nossa mente, como a comunicação é um erro de amador e uma demonstração de ignorância se propositado. Desde a pequena organização ao maior Estado. As palavras, a semiótica, o storytelling, são ainda, talvez mais que nunca, uma ferramenta poderosíssima.

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No dia da memória das vítimas do Holocausto, tivemos, ironicamente, nas bocas de muita gente (que se interesse por política) o nome Adolfo.

Não o Adolfo do Holocausto, mas o Adolfo do CDS-PP. O ex-secretário de estado do Turismo escreveu um artigo no Observador, intitulado "Uma nova força para o CDS", um dia depois de se assinalar 1 ano de mandato de "Chicão" , em que parece anunciar a sua vontade de se candidatar a presidente do CDS.

Muitos viram isto como a possibilidade de ter um Adolfo a salvar o CDS do Holocausto político que atravessa, outros como mais uma enorme contribuição para esse mesmo Holocausto. A verdade é que a existir esta candidatura e a efetuarem-se as eleições antecipadas que Adolfo Mesquita Nunes (AMN) pede no seu artigo, pode ser um de dois: ou representará mais uma cisão, mais um cavar de trincheiras entre os militantes centristas ou funcionará como uma última injecção de adrenalina no histórico partido do Caldas.

Por um lado achei uma retirada brusca do tapete, dos pés de Francisco Rodrigues dos Santos (FRS), com uma série de demissões seguidas em poucos dias. Pareceram combinadas, ou enquadradas no momento em que AMN se lança para a candidatura e desafia o presidente do CDS-PP a marcar um congresso eletivo.

Entre essas demissões destacam-se a de Filipe Lobo Dávila, que já fez questão de explica no seu Facebook que a carta de demissão foi escrita muito antes do anúncio de Adolfo, e a de Raúl Almeida, conhecido amigo de AMN e que não explicou nada, pelo menos que me tenha apercebido.
O que é certo é que logo no artigo que serviu de tiro de partida para a candidatura de Adolfo, este avança vários nomes que, na sua opinião, necessitam de ser "recuperados" (entre aspas porque muitos estão no ativo). Nessa lista já consta o nome de Lobo Dávila. Coincidência? Aceito que sim.

Há também uma outra versão acerca das demissões e do momento de rutura da Direção de Chicão, que aponta como fator desencadeador para este momento, os problemas financeiros do partido.
Não tem sido propriamente segredo, já que até aquando da última vez que se batalhava pela presidência do CDS, batalha da qual FRS saiu vencedor, o estado das finanças do Caldas foi um dos temas quentes, com acusações de má gestão à Direção de Assunção Cristas.
Assim, diz-se, os vices de Chicão que se demitiram no dia da candidatura de AMN, fizeram-no não pelo anúncio do ex-secretário de Estado, mas porque este dia foi também coincidente com uma tentativa de capitalização do partido que saiu frustrada - Holocausto financeiro?.

Diga-se de passagem que não abona muito em favor de um partido de direita, ter tão pouco controlo na informação interna e especialmente quando esta afeta uma das suas principais bandeiras políticas. Falo do rigor financeiro.

GUERRA DE AUDIÊNCIAS e GUERRA DAS "BASES"

Desde que Adolfo Mesquita Nunes anunciou a sua candidatua, que o CDS tem saltado para as primeiras páginas de jornais, tem sido tema de muitos artigos de opinião e é notório um combate nas redes sociais, pela audiência dos militantes mas também uma medição pública de notoriedade.
Aos mais desatentos, peço que atentem para quando FRS fizer algum "live" no Facebook, e reparem que assim que termina, Adolfo fará outro.
Do que pude constatar até agora, Mesquita Nunes leva vantagem na audiência das redes sociais. Diria que isso é fruto da sua notoriedade mas também por ser uma forma de comunicação a que tem recorrido frequentemente há vários meses, o que o levou a fidelizar uma audiência.

IMG_20210205_175922.jpgAinda nas redes sociais, tem sido notória a agitação entre as bases, com concelhias e distritais a precipitarem-se nas juras de amor ao líder ou nos incentivos ao challenger. Por ser a minha terra natal, naturalmente estou mais atento às estruturas partidárias daqui, e onde tem sido notório o apoio de algumas concelhias e da distrital do CDS em Setúbal, ao atual presidente.

No entanto já me deparei também com grupos de apoio a Adolfo Mesquita Nunes e a Francisco Rodrigues dos Santos, criados por militantes anónimos, ou pelo menos que não reconheço
O Facebook tem sido a rede mais quente, onde se podem encontrar mais comentários de ataque e contra ataque, e no qual me deparei com uma colisão de "notáveis", neste caso Francisco Mendes da Silva, a criticar publicamente um post de Joana Bento Rodrigues (não tão notável mas herdeira do movimento de Abel Matos Santos, o psicológo que curava homossexuais). A visada refere no seu post que o partido deve livrar-se dos liberais, Francisco Mendes da Silva repudia essa atitude que considera ser destrutiva para o partido.

Na comunicação social, tal como disse, o CDS tem sido tema quente também, com notícias diárias acerca de demissões ou reportagens sobre o challenger Adolfo Mesquita Nunes. Os espaços de comentário também se tornaram num campo de batalha dos centristas, que têm aproveitado para enviar recados. Os apoiantes de Adolfo largam bombas opinativas à presidência de FRS e vice versa. Ribeiro e Castro tem sido um dos destacados neste combate virtual, tomando as dores de Francisco, pois reconhece-se no papel deste aquando das movimentações de Paulo Portas para o retirar da presidência do partido. Ribeiro e Castro considera que o desafio de Adolfo se trata de mais uma "golpada".


UM PARTIDO DE DIREITA QUE NÃO GOSTA DE COMPETIÇÃO?


O CDS-PP atravessa um momento muito difícil, com muitas dificuldades financeiras, dificuldades de afirmação no espaço mediático e dificuldades em demonstrar aos eleitores que continua a ser fulcral para o espectro centro-direita português.

Eu considero que este é um partido fundamental para a nossa democracia e que é urgente que se reencontre. Não acredito em direitas histéricas, que funcionam como seitas de evangélicos e não apresentam soluções para nada, como é o caso do Chega. Não acredito em iniciativas de riquinhos,  capitalistas selvagens com tiques de superioridade por se considerarem cosmopolitas iluminados, que é o que para mim representa a IL.

Penso que o CDS reunia e ainda pode continuar a reunir o equilíbrio saudável da direita, tal e qual o que acontece na Alemanha, na Áustria ou no Reino Unido, onde partidos que partilham da mesma ideologia do CDS-PP são governo e, no caso da Alemanha, o trabalho é reconhecido internacionalmente, pela positiva. Aliás, cruzei-me há pouco tempo com uma citação partilhada pela página de Instagram da Juventude Popular de Setúbal, da Chanceller Angela Merkel em que esta assume ser por vezes liberal, por vezes conservadora e por vezes democrata-cristã. É esta partilha de valores funciona e não a sua divisão.

Daí que me parece que os centristas cometem o erro ao não terem capacidade de se distanciar dos seus egos, de se distanciar de líderes e de olharem para o partido como um tudo, avaliando: "O que é o melhor para o partido neste momento?"
Prosseguir com o trabalho que tem sido efetuado pelo Francisco Rodrigues dos Santos, ou assumir a sua inviabilidade e arriscar rapidamente noutro projeto, neste caso apresentado por Adolfo Mesquita Nunes.
Devem insistir com a Direção de FRS, defendendo-o e cerrando fileiras contra os apoiantes de Adolfo ou pressioná-lo a fazer algo de diferente já que agora tem competição interna?

Pelo que se tem visto, os militantes andam confusos, nervosos e vão agir de cabeça quente preparando uma "luta" entre democratas-cristão e liberais.
Repare-se que no início do mandato Chicão era tido como um líder conservador. Agora ao que parece é o expoente máximo da democracia-cristã. Já o Adolfo, como tem boas relações com membros da IL, é visto como um demónio que irá tornar o CDS numa segunda iniciativa liberal. O que é certo é que só mesmo no CDS é que se considera AMN um perigoso liberal. Se assim fosse, duvido muito que se tivesse aguentado tantos anos no partido.

Por incrível que pareça, o partido centrista está a despender imensa energia, de cabeça enfiada no rabo, e a ver problemas onde não existem.
Um partido capitalista, de direita, que defende que a competitividade é o motor da criação de riqueza não pode achar que o mesmo não funciona para dentro do partido. São comunistas internamente e capitalistas externamente?

A competição é boa, é desejável, está a colocar o CDS novamente no centro mediático (por muito supérfluo que pareça também é importante) e devia ser recebida com alegria por todos os militantes daquele partido. Se o Cristiano Ronaldo não se superasse diariamente, não faltariam excelentes jogadores para ocupar o seu lugar de melhor do mundo. 

Ou o atual líder se empenha mais ou a competição engole-o. É o mercado.



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Não ofender, tem sido o mote nos últimos tempos para proibir, apagar, recuar, evitar em inúmeras situações. Umas vezes por iniciativa estatal, outras de índole privada e até de cariz pessoal. Também tem originado acérrima discussão entre os que defendem o direito a ofender e os que têm uma lista interminável de situações que consideram ofensivas.


A TVI, e especificamente o reality-show Big Brother, têm (não sabemos se oportunisticamente ou não) surfado esta onda com grande destaque. O programa tem apostado em evitar situações ofensivas, ao sabor do que se vai escrevendo nas redes sociais. Violência físíca e verbal, expressões discriminatórias, bullying entre outros, têm sido veementemente repudiados e reprimidos pela organização do programa. Por vezes díscutivel, mas na generalidade bem apontado. Ainda que acabe por tornar um programa que, já por si é bastante censório, num quadrado bastante reduto, de liberdade. Não espelha de todo o que é a vida "cá fora", como é apanágio dos promotores do formato, dizerem.
Durante o fim-de-semana, parece que uma ex-concorrente do programa, Sónia Jesus, se estreou numa nova via profissional: Repórter. A novidade acabou por colidir com alguma indignação, muítissimo moderada, nas redes sociais. Não é que não se esteja habituado a ter incompetentes a trabalhar na televisão, ou a ver promovida, gente sem qualquer formação para o que faz. Mas cada vez custa mais.


A TVI que se tem preocupado tanto em não ofender, não terá ninguém na Direção que veja o quão ofensivo é catapultar uma ex-concorrente de reality show dos mercados, diretamente para o lugar de repórter?
Há milhares de jovens, todos os anos a ingressar em cursos de jornalismo, comunicação social, ciências da comunicação e que na maioria dos casos nunca vêem retorno para o investimento pessoal e financeiro que fizeram. É justo que fiquem em casa a depararem-se com uma Sónia a exercer algo para o qual não tem absolutmente mérito nenhum?
Serão os diretores de programas da TVI assim tão desprovidos de ética e brio profissional, que não se importam de negligenciar a prórpia área em prol de audiências?

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É caricato que este tipo de desrespeito pelos estudantes e pelos pais dos estudantes, não seja tido em conta como "conteúdo ofensivo". Os pais ficam confortáveis a ver que andam a financiar cursos aos filhos para chegarem estas pessoas e passarem à frente?
Os coordenadores de cursos superiores de comunicação não têm nada a dizer? As Instituições de Ensino Superior onde são leccionadas estas àreas, não se importam com a desvalorização que isto significa para os cursos?
Esta é mais uma daquelas situações que não se vê noutra profissão. Porque mais uma vez fica patente, que se olha para os profissionais da comunicação como palhaços de circo. Não se ousaria colocar um qualquer a fazer de advogado, engenheiro ou gestor. Mas aqui, quem entreter melhor passa à frente de quem se esforça e dedica uma parte da sua vida a estudar para exercer a profissão.

 

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