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The Pólis

Há um sketch dos Gato Fedorento, "Matarruanos dão indicações", em quem uma automobilista se aproxima de um senhor, um matarruano, e lhe pede indicações para o Centro Cultural. O indivíduo, muito prestável, dá-lhe as indicações: "(...)vai recto, apanha um caminho para a direita, não vira! Apanha um caminho para a esquerda, não vira!(...)". Nisto, um segundo matarruano que está a passar e se apercebe de que o seu conterrâneo está a dar direções para o Centro Cultural, decide intervir porque notou que estavam erradas. Ficam então os dois a dar indicações contraditórias sobre como chegar ao mesmo sítio. O sistema repete-se com um terceiro e um quarto matarruano. A automobilista fica a ver os quatro homens a digladiarem-se com diretivas contrárias uns aos outros, tentando superiorizar-se no volume, durante uns minutos até que desiste e decide arrancar com o carro sem querer saber das indicações de ninguém.
 
 Por os Gato Fedorento terem sido uma constante durante a minha adolescência, existem inúmeras situações que me remetem para os seus sketches. Este em particular, surgiu-me à memória quando refleti sobre a panóplia de indicações, contra indicações e falsas indicações que nos têm sido transmitidas até hoje, acerca da pandemia de covid-19. Quem não conhece o vídeo, aconselho a visualização e experimente colocar a população portuguesa no lugar da pobre automobilista e no lugar dos matarruanos o Governo, os partidos, o Presidente da República, a Ordem dos Médicos, a Ordem dos Enfermeiros, os virologistas, os comentadores. Pode imaginar mais uns quantos matarruanos para representar os negacionistas do Qanon, em forma de Médicos e Jornalistas "pela Verdade".
 
E nós, sentados no carro, de olhos trocados e já com pouca paciência para conspirações das máscaras, restrições à circulação que são apenas recomendações ou dos mesmos avisos desde março de que a situação via piorar, acabamos por "arrancar". Uns escolhem ouvir apenas fontes oficiais, outros enveredam pelas conspirações e uns terceiros desistem de ouvir quem quer que seja e decidir tudo à sua vontade.
 
Quando as autoridades de saúde não conseguem ser a voz que se destaca no meio de todas as outras, quando o governo revela desgoverno nas orientações à população, a tarefa de diminuir o nº de infecções torna-se hercúlea. O Ministério da Saúde está descredibilizado, Marta Temido não inspira confiança a ninguém a não ser à Cristina Ferreira - que dá festas "de arromba" em casa sem uma única máscara à vista.
 
A crise pandémica parece ainda ter muitos episódios por vir. Atrás, como já vem sendo previsto há uns meses, virá a crise económica que afetará com mais intensidade, como sempre, as famílias desfavorecidas, os jovens que pretendiam ingressar no mercado de trabalho, os pequenos empresários.
Felizmente poderão contar com a esquerda que, vendo uma crise à vista, terminou o seu estado de oposição em layoff e aplicou a necessária distância de segurança do Governo. A partir do próximo Orçamento de Estado (OE) já podem fingir (ainda mais), que não tiveram nada a ver com o que não foi feito até hoje, que não têm culpas no desinvestimento do SNS ou da Educação. A proposta de OE para 2021 passa agora a comprometer os objetivos da Geringonça, que eram sorrir e acenar quando apareciam medidas populares, e fingir-se de morta aquando das medidas mais mázinhas.
 
Citando uma célebre deputada do Bloco de Esquerda, eleita pelo distrito de Setúbal, para descrever o comportamento dos parceiros do Governo: "como é que se chamam aqueles animais que rondam a área à espera de uma morte para se alimentarem?". Estes já se estão a colocar em posição. 

 



 

 

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