"O que vai ser do CDS"
artigo de Lourenço Pereira Coutinho
Fica a sugestão de artigo, pequeno mas assertivo, sobre o histórico CDS. Hoje, no Expresso:
Não é a primeira vez que o escrevo neste espaço: custa-me ver o CDS reduzido a um partido inexpressivo, que não consegue passar a mensagem e que só é noticia pelas desavenças internas. Quem observe à distância, como é o meu caso, apenas vislumbra algo em desagregação e que corre o risco de desaparecer.
Não é demais recordar que o CDS foi o único partido que, em 1976, votou contra a visão marxista da primeira versão da nossa constituição e que, depois, prestou um contributo decisivo para a afirmação de um regime verdadeiramente plural e civilista. A partir de 1979, e com exceção do tempo cavaquista, o CDS fez sempre parte das soluções governativas de direita, e os seus quadros, a maioria de reconhecido mérito, contribuíram de forma valiosa para a saúde da nossa democracia.
O CDS não merece pois o que está a acontecer. Esta é sem dúvida a sua crise mais preocupante, pior até que a vivida durante as maiorias cavaquistas. Então, contava com deputados da dimensão de Nogueira de Brito, Lobo Xavier e outros. Podia ser o partido do táxi, mas este transportava políticos de grande qualidade.
A crise vivida entre 1987-1992 foi porém de magnitude, pois as maiorias absolutas do PSD podiam ter aniquilado o CDS. Tal não aconteceu porque a dupla Manuel Monteiro/Paulo Portas (este então ainda fora da política partidária) vincou, a partir de 1992, um discurso diferenciador, com laivos de populismo, que atraiu os descontentes com o cavaquismo, na altura já muitos, e garantiu um bom resultado nas eleições de 1995.
A partir de então, o partido manteve políticos de valor mas, gradualmente, tornou-se dependente de um único homem: Paulo Portas. Este teve o mérito de reafirmar o CDS como partido imprescindível mas o demérito de secar tudo o que não girava à sua volta. A diversidade que caracterizava o CDS - democratas-cristãos; conservadores e liberais, esbateu-se assim no portismo. O atual drama dos centristas reside precisamente na sua incapacidade de superar a orfandade de Paulo Portas, agora no comentário televisivo e a fazer o tirocínio para uma provável candidatura à presidência da república.
Com as suas muitas qualidades e vários defeitos (bem contrabalançados entre 2011-15 pela firmeza ponderada de Passos Coelho) Paulo Portas é para mim o político de direita melhor preparado e mais fazedor desde Sá Carneiro e Adelino Amaro da Costa. Sabe definir uma estratégia diferenciadora e como lá chegar, é carismático, pragmático e um comunicador nato. Ora Francisco Rodrigues dos Santos é o contrário disto tudo. A falta de carisma e de flexibilidade tática impede-o de unir o partido e de seduzir um eleitorado agora com mais escolha.
Pior, a sua estratégia não passa para a opinião pública: com esta liderança, o partido é democrata-cristão, conservador ou popular? E quais as diferenças entre ser popular e populista? Que estratégia de alianças? Qual o posicionamento face ao PSD? - com Rui Rio estacionado ao centro, o CDS perdeu uma oportunidade de ouro para captar eleitorado de direita - E que propostas diferenciadoras, como convencer que o CDS continua a ser indispensável? Acredito que Francisco Rodrigues dos Santos tenha respostas para tudo isto, o problema é a sua incapacidade de as explicar e de as pôr em prática. Atualmente, o CDS conta muito pouco.
O desconforto de Nuno Melo a fazer campanha para as autárquicas junto a Francisco Rodrigues dos Santos foi notoriamente constrangedor e revelador. Simbolicamente, espelha a fratura irreconciliável entre a elite portista e a apregoada linha popular de Rodrigues dos Santos. Curiosamente, a bandeira popular foi precisamente a que Paulo Portas usou para se afirmar no CDS. Enquanto a elite portista inspira-se no politico grave do século XXI - ministro, vice primeiro ministro e mais que provável candidato à presidência da República - Rodrigues dos Santos parece estar a trilhar os mesmos caminhos do “Paulinho das feiras”. O que vai ser então do CDS? Um portismo sem Portas? Ou, então, um híbrido entre o PP do “Paulinho das feiras” e o populismo de Ventura? Por enquanto, o partido continua órfão, e claramente na sombra.